CAPA DO MÊS:
LIZANDRO MALUF
UMA VIDA PELOS CHEIROS
por: Sérgio Oliver

Para quem é apaixonado por perfumes, conhecer os bastidores do universo da criação de uma fragrância é uma experiência única, e, ao conversar com os grandes criadores desse produto tão amado, o momento fica ainda mais especial! E assim foi o bate-papo nessa entrevista exclusiva com o talentoso perfumista da casa de fragrâncias Dierberger, Lizandro Maluf, um profissional que fala da perfumaria com o mesmo brilho nos olhos de quando iniciou sua jornada perfumada!

De onde vem a sua paixão por perfumes?

Desde as décadas de 50, 60 e 70, os meus pais atuavam na empresa internacional Casa Accossato, que atendia à alta sociedade, como astros do cinema, com itens relacionados à estética, vestuário, joias e na comercialização de cosméticos e perfumes importados. Era referência no Brasil, com filiais na Europa e Estados Unidos, e, desde criança, tinha esse contato com os perfumes que os meus pais usavam de marcas mundiais.

Você se tornou perfumista em uma época em que essa profissão era totalmente desconhecida. Como teve conhecimento desse setor e o que o despertou para querer trabalhar com fragrâncias?

Através dos meus pais que tinham contato com o diretor comercial da primeira empresa de fragrâncias do mundo, a ANTOINE CHIRIS, fundada na cidade de Grasse, no sul da França em 1768, e que se instalou no Brasil logo após a segunda guerra mundial, em São Paulo. A estrutura contava com 2 fábricas. Uma estava localizada no aeroporto de Congonhas e era focada na produção de hidrocarbonetos aromáticos como Metilionona, Hidroxicitronelal, Citronelol, Geraniol, etc. e na extração de óleos essenciais e resinóides como Lábdano, Lavanda, Estoraque, etc. A segunda fábrica, localizada no bairro da Ponte Pequena, era o centro criativo e de produção de fragrâncias, sendo a primeira importadora e comercialização da América Latina de produtos sintéticos e naturais.

Tive a oportunidade, no início dos anos 70, de ingressar na empresa atuando no laboratório de desenvolvimento e, posteriormente, no controle de qualidade de matérias-primas e fragrâncias com a inclusão do Cromatógrafo de Gás.

 Após muitos anos, a empresa ANTOINE CHIRIS foi adquirida por outras empresas internacionais e, atualmente, pelo Grupo Givaudan.

Você teve algum incentivo ou inspiração para sonhar  em ser perfumista, já que não era uma profissão tão conhecida e fácil na época?

Na ANTOINE CHIRIS, tive a oportunidade de conhecer o primeiro perfumista a pisar em solo brasileiro, Monsieur Francis Torino, e vários outros perfumistas com que tive a honra de ter adquirido a técnica da memória olfativa e a arte na criação de fragrâncias. Tenho formação em QUÍMICA e musical como PIANISTA, com sensibilidade de interpretar CHOPIN, MOZART, como a natureza em arte das flores.

Qual foi o seu primeiro emprego como perfumista e qual foi a sua primeira criação. Como foi essa experiência?

Após alguns anos na primeira empresa, a ANTOINE CHIRIS, fui promovido a Perfumista Junior e, mais tarde, quando a empresa foi adquirida por outras empresas internacionais, tive a oportunidade de uma experiência única de atuar no início da empresa DIERBERGER, na área de fragrâncias, sendo a única empresa na extração de óleos essenciais e na elaboração de aromáticos através da extração de naturais no Brasil. Em seguida, fui convidado pela empresa ROBERTET & Cie como Perfumista, onde criei muitas fragrâncias com um espectro maior de naturais e sintéticos atuando em vários segmentos da época.

Além do briefing, o que mais o inspira na hora de criar uma fragrância?

A inspiração em criar uma fragrância é como compor uma música: com as notas musicais na melodia de seus acordes onde envolve um sentimento e o amor.

Dentre as matérias-primas disponíveis para um perfumista, qual é aquela que não pode faltar em sua composição e por quê? Qual é a mais difícil de se trabalhar?

A composição de uma fragrância não depende apenas de uma matéria-prima e sim da combinação de várias. Uma nota olfativa é como um instrumento musical na formação de uma orquestra como as notas de saída, corpo e fundo, da qual não pode faltar uma boa fixação para um excelente “lasting” e, hoje, por determinadas restrições, os naturais de origem animal são os mais complexos para trabalhar em uma criação.

Como é o dia de um perfumista em uma casa de fragrâncias?

O amor presente e constante no convívio com a equipe, onde envolve a vontade do bem-estar e da alegria de poder colaborar na fonte de ideias e na execução de nossas criações para o sucesso de nossa equipe.

A profissão de perfumista cresceu muito de alguns anos pra cá, tanto pelo papel da mídia como a divulgação dos perfumistas responsáveis pelos produtos das grandes marcas até o próprio consumidor que agora também gosta de saber quem é o criador da fragrância que está usando. Como você vê esse novo momento?

A arte de um perfumista atualmente se tornou mais comercial e, em grandes criações, não vejo mais a complexidade como nos antigos acordes, onde envolvia o uso de naturais mais complexos e a diversidade de acordes em sua composição, se tornando mais rica e nobre. Como podemos comparar um CLAIR DE LUNE de Debussy com um sambinha, e não desmerecendo da nossa arte musical brasileira, como o nosso saudosista maestro TOM JOBIM, é evidente que certas criações do século passado de grifes como Dior envolviam o uso de um Jasmim Egypto Absoluto e do Jasmim Egypto Óleo Essencial, ou seja, além dos naturais, o absoluto e óleo presente no acorde de um fine, as notas naturais se expressam na saída e no corpo.

A divulgação do nome do perfumista na criação de um perfume sempre foi presente no site FRAGRANTICA como prestigiar a casa de fragrâncias.

Algumas das criações de Lizandro Maluf (fotos: Divulgação)

O mercado internacional tem enxergado no Brasil um grande potencial para a venda de perfumes de nicho já que esse segmento tem crescido muito por aqui. Como você vê essa mudança no gosto de alguns brasileiros por essa perfumaria tão diferente e especial?

O mercado brasileiro tem um potencial enorme para todos os segmentos de perfumes na qual a exigência de qualidade para um custo mais comercial e adequado para as nossas classes sociais com um crescimento na oportunidade de poder valorizar a arte de se perfumar.

Qual conselho você daria para quem deseja se tornar um perfumista? Quais as dificuldades que podem surgir e qual a frase chave para não desistir de realizar este sonho?

Em primeiro lugar, tem que gostar da arte e, principalmente, dos desafios. Na medida em que vai se aprendendo, o amor se eleva a cada conquista e o melhor aprendiz é ser discípulo de um grande mestre.

Fotos: Renan Ramos
Publisher e Diretor Criativo: Sérgio Oliver
Supervisão de texto: André Terto
Arte gráfica e diagramação: Danni Chris